segunda-feira, 25 de maio de 2009

A originalidade do Desenvolvimento Sustentável: vertente económica.

OS BANCOS SÃO OS MOTORES DA SUSTENTABILIDADE

Sofia Santos, directora-geral da Sustentare*, faz um balanço actual das linhas mestras que traçam o conceito da Sustentabilidade, fala de estratégias e explica de que forma os mercados financeiros influenciam e são influenciados por este tema.

O que é a Sustentabilidade?
A sustentabilidade, ou desenvolvimento sustentável, consiste na tomada de decisões de gestão que têm em conta o seu impacto ambiental, social e ético a médio e longo prazos. Estas decisões podem ser tomadas pelos Estados, empresas e cidadãos. A definição mais conhecida foi publicada em 1987 no Relatório de Brundtland, definindo o desenvolvimento sustentável como aquele que satisfaz as necessidades das gerações actuais sem colocar em perigo a satisfação das necessidades futuras.

Em traços gerais, quais são as grandes linhas de evolução do conceito?
O desenvolvimento sustentável, ou sustentabilidade, foi inicialmente definido como tendo três pilares: ambiental, social e económico. Uma gestão sustentável seria aquela que conseguisse equilibrar estes três âmbitos. No entanto, o conceito tem evoluído e, actualmente, a sustentabilidade é entendida como a gestão dos aspectos ambientais, sociais e de governance (ou ética). Esta gestão sustentável vai além dos padrões exigidos por lei, uma vez que vai ao encontro das expectativas de vários stakeholders.

O que significa Sustentabilidade para emprersas, governos e cidadãos?
Significa a tomada de decisões a médio e longo prazos, tendo em conta, nas opções de consumo actuais, o impacto que isso pode originar no futuro. Nas empresas, poderá significar a existência de um código de fornecedores, a criação de produtos amigos do ambiente, a existência de políticas e práticas ambientais e uma ligação forte com a comunidade envolvente. Nos governos, poderá significar a existência de uma coerência entre políticas fiscais, sociais e ambientais. Ao nível de cada um de nós, pode significar procurar saber se o café ou a t-shirt de algodão que estamos a comprar foi produzida sem utilização de mão-de-obra infantil ou se existe alguma garantia de ter existido um pagamento justo aos agricultores. Significa, acima de tudo, um trade off entre o consumo efectuado hoje e as suas consequências nas gerações seguintes.

Qual a importância de ter uma Estratégia de Sustentabilidade?
Quando as empresas afirmam ter uma estratégia de sustentabilidade, isso deveria significar a existência explícita e verdadeira de um caminho e um objectivo a atingir, tendo, também, identificado as acções que devem ser realizadas, quem as deve fazer e com que orçamento. No fundo, significa incorporar nas decisões estratégicas, e depois nos processos, considerações do foro ético, ambiental e social, que irão originar a criação de produtos e serviços específicos.

De que forma os mercados financeiros têm dado relevância a este tema?
Os mercados financeiros têm uma imensa influência. Os fundos de investimento, ao escolherem as acções da sua carteira, podem optar por seleccionar empresas com boas práticas. Na realidade, o montante de fundos de investimento responsável na Europa já representa 15 por cento da quota de mercado. Outro factor importante está relacionado com a existência de índices financeiros, como o Dow Jones Sustainability Index ou o FTSE4GOOD, que incorporam apenas empresas que correspondem a um conjunto de critérios económicos, de governance, de ambiente e sociais.

E os bancos? Onde se encaixam em todo este processo?
Os bancos são os principais promotores da sustentabilidade. Emprestam dinheiro a todos os agentes económicos: cidadãos, empresas, instituições e Estados. Por isso, se todos os bancos, quando emprestam dinheiro, impusessem critérios ambientais e sociais em relação à sua utilização, muitos dos problemas actuais seriam evitados.

Se os bancos são os principais motores da Sustentabilidade, como é que isso se concretiza na prática?
Os bancos são os motores da sustentabilidade, na medida em que, através da taxa de juro, podem induzir as preferências dos consumidores e as escolhas de investimento das empresas. Por isso, têm todo o poder para a criação de economias sustentáveis. E há muita coisa que um banco pode fazer. Desde logo, ao nível dos empréstimos. Podem ter critérios ambientais e privilegiar as situações com impactos menores no ambiente. Podem actuar, também, através de spreads mais baixos para a aquisição de casa com certas características, que vão desde os painéis solares ao aproveitamento das águas pluviais. Nas empresas, através de taxas de juros preferenciais, por exemplo, podem contribuir para a mudança da frota de automóveis por outros com menores emissões de CO2 ou para uma uma remodelação da tubagem para a a utilização de gás natural. Podem, também, ter um conjunto de requisitos que devem ser respondidos pelas empresas, aquando da solicitação dos empréstimos, de formaa ajudá-las a cumprir a legislação em vigor e a vindoura.

Existe alguma ligação entre a actual crise financeira internacional e os temas da sustentabilidade?
Existe. A ligação dá-se pelo pilar da Governance, que significa, no contexto da sustentabilidade, olhar a longo prazo, garantir a transparência e uma comunicação clara e simples. A sustentabilidade é, acima de tudo, uma questão de bom senso e não uma moda ou uma teoria muito erudita.

Como vê a actuação dos bancos no contexto dessa crise?
Back to basics! Esta crise veio fazer com que os bancos se refocalizassem naquilo que é suposto fazerem: receber poupanças e investi-las. Investir é diferente de consumir. Investir é, de facto, diferente de especular. Penso que as comparações que se fazem com 1929 são exageradas e que o mundo de hoje é totalmente diferente do dessa época. Mas existe, de facto, uma crise que abalou os bancos, que vai originar uma maior quantidade de legislação e uma tendência para o conservadorismo nos investimentos.

A legislação ambiental é, cada vez mais, intensa e exigente. Haverá consequências para os bancos?
A consequência pode ser o aumento do crédito mal parado por parte das empresas, por não conseguirem manter as licenças ambientais; investir em equipamento para reduzir os seus impactos no ambiente de forma a cumprir com o exigido nas licenças; implementar um sistema de gestão ambiental robusto; mudar para matérias-primas mais amigas do ambiente, entre muitos outros. Por exemplo, existe uma directiva comunitária – o REACH – que vai implicar que certas indústrias tenham de fechar ou de alterar o seu negócio, pois a utilização daquilo que produzem (uma certa substância química) passa a ser ilegal. Outro exemplo é a Directiva da Responsabilidade Ambiental, em que os danos ambientais de uma empresa terão de ser compensados ou anulados. Caso as empresas não sejam capazes de compreender, antecipar, adaptar e cumprir estas leis ambientais, então, poderão incorrer em multas pesadas ou mesmo no fecho das instalações.


*SUSTENTARE Uma consultora especializada em estratégia, modelos de governo das empresas e gestão da sustentabilidade, tendo como principal actividade aconselhar o sector privado a gerir os riscos e as oportunidades associados aos aspectos ambientais e sociais do negócio.

In Caixa em Revista, nº30. Março 2009, ano 5, páginas 20 e 21.

Sem comentários:

Enviar um comentário